
FASES DA VIDA DE AGOSTINHO
PERGUNTA:
Natan, o que se salva da vida e obras de Agostinho?
RESPOSTA:
Há muito proveito em se estudar a vida e as obras de um homem. Tanto para se inspirar por meio das coisas boas alcançadas por ele, como também para se perceber os desvios ao longo da tragetória e tomar isso como exemplo para nossa vida. Os erros de alguém importante, servem de alerta a todos que vierem a conhecer a sua história. No caso de Agostinho, vemos uma tragetória tortuosa em sua vida na busca pela “origem do mal” desde a sua adolescência e ao longo da vida. Há cerca de cinco fases na vida de Agostinho:
- A primeira fase diz respeito ao tempo em que Agostinho era pagão, que durou até quando ele tinha 19 anos de idade. Quando ele tinha 16 anos de idade ele manteve um relacionamento com uma jovem da qual teve um filho quando estava com seus 17 anos, a quem chamou de Adeodato. Com 17 anos foi para a universidade cultivando diversos questionamentos a respeito da natureza do mal. Esse ponto em particular lhe acompanhou durante praticamente toda a sua vida, e em diferentes momentos ele vai mudar seu ponto de vista a respeito da origem e da natureza do mal sob a influência de diversas ideias filosóficas e religiosas pelas quais passou. Isso também vai ser um ponto chave na sua decisão tardia em afirmar que o homem não teria livre-arbítrio, indo contra todos os teólogos cristãos anteriores a ele. O tipo de mal que lhe preocupava não era o mal que poderia ser praticado ou causado pelo homem, mas as emoções ruins que o homem poderia sentir, tais como tristeza, descontentamento e desmotivação, decepções e sentimentos ruins que lhe sobrevinham. Ele gostaria de saber de onde vinha tudo isso, caso houvesse uma resposta para essa indagação.
- Na segunda fase da sua vida, enquanto estava na universidade de retórica ele aderiu ao Maniqueísmo. Como maniqueu, aceitou o conceito de que o mal sobre o qual ele procurava respostas era uma consequência do conflito entre o “reino e o príncipe da luz” contra o “reino e o príncipe das trevas”. Esta seria a explicação maniqueísta do porquê o homem experimenta tanta frustração e sentimentos ruins. Não havia coisa alguma que o homem pudesse fazer a respeito, o conflito acontecia sem que o homem pudesse interferir. Durante esta fase da sua vida, que durou cerca de dez anos, Agostinho acreditou que o homem não possuía livre-arbítrio para interferir ou mudar qualquer coisa, pois era isso que o Maniqueísmo ensinava.
- Na terceira fase da sua vida, Agostinho fazia seus estudos na universidade e em certo momento recebeu uma proposta de trabalho em Roma. Deixou sua cidade natal de Tagaste, no Norte da África e mudou-se para Roma. Enquanto estava em Roma tornou-se muito cético e começou a se desinteressar pelo Maniqueísmo considerando-o insuficiente para responder suas dúvidas quanto ao mal e sua origem. Enquanto se via nessa condição encontrou os ensinamentos do Neoplatonismo, que era uma espécie de reavivamento das ideias de Platão. O início desse movimento tinha sido causado por um homem chamado Plotino, que mantivera uma escola na cidade de Roma e mesmo depois de sua morte, seus ensinamentos continuaram se propagando pela região. O Neoplatonismo ensinava que tudo emanava do “Grande Uno”, a essência do bem. Neste sentido, não havia de fato o conceito de “mal”, pois tudo funcionaria de acordo com um “plano mestre geral”, do qual supostamente tudo emanava e tudo estaria sob o controle absoluto desta “entidade perfeita”. Isso significava que o sofrimento, a dor e até mesmo a punição no inferno, eram todos considerados como coisas “boas”, pois estariam debaixo de um plano maior e soberano. Agostinho também aceitou a ideia neoplatônica de que tudo era causado por este ser e que o homem não possuía livre-arbítrio, pois tudo seria causado por esta entidade ou ser supremo.
- Em dado momento, Agostinho mudou-se de Roma para Milão, quando finalmente entrou na quarta fase da sua vida, tornando-se cristão em 386 d.C.. Converteu-se através das pregações do Padre Ambrósio que também uasva princípios neoplatônicos em suas mensagens. Até o ano de 412 d.C. manteve-se defendendo as mesmas coisas que haviam sido defendidas pelos antigos teólogos cristãos, porém, deste ano em diante, começou a radicalizar-se entrando na quinta e última fase da sua vida.
- Durante sua última fase, reverteu aos velhos conceitos gnósticos de depravação total da humanidade, predestinação de seres individuais e aos princípios das filosofias gregas de microgerenciamento divino sobre toda e qualquer atividade humana. Foi nesta época que ele contradisse tudo que havia falado anteriormente, e quatro anos antes de morrer, escreveu um livro chamado “retratações”, onde tentou se justificar do porquê mudou sua forma de pensar sobre a doutrina cristã e agora estava crendo de forma totalmente diferente de todos os teólogos anteriores e diferente até das coisas que ele mesmo acreditava. Foi nessa época que introduziu o predestinismo gnóstico na teologia cristã, usando termos mais bíblicos para justificar suas sandices.
O maior proveito que podemos tirar dessa história é a aprendizagem pessoal de que mesmo homens inteligentes e verdadeiramente interessados, também podem cair na armadilha de vãs filosofias. Afinal, a vaidade é uma armadilha sutil e perigosa que pode capturar e cegar o coração de qualquer um, até dos mais influentes e poderosos.
Mais sobre esse assunto no livro “As Origens Gnósticas do Calvinismo”
Parte das informações do texto acima, pode ser encontrada nesse vídeo:
Augustine and Free Will – An Interview With Dennis Carrol